Texto: Jamille Ipiranga
Seu apelido era “Moça Branca”, nascida em Pernambuco, com sotaque lindamente carregado, filha de Manoel Lourenço e Maria Flauzina. Na linha de nascimento foi a sexta filha, sendo oito mulheres e quatro homens.
Edenice Maria da Silva, nasceu no campo, em Gravatá no ano de 1964. Junto
com seus pais trabalhou na agricultura, colheu café, algodão, mandioca e
batata. Aos 12 anos brincava, mas também trabalhava, auxiliando os pais fazendo
a manutenção de mercadorias dos pontos de negócios dos vizinhos. Integrante de
família grande, do interior. Hoje são 12 filhos, 19 netos e 13 bisnetos.
Esperta, ativa e cheia de sonhos, a criança Edenice pensava em ser
professora ou empresária.
Da infância, guarda muitas recordações felizes. Gostava de conversar com
os pais e ouvir histórias. Pelo pai foi alfabetizada, pela mãe, catequizada. De
família pobre, aprendeu cedo a lidar com poucos recursos, administrar o que
tinha. Mais tarde veremos que essa realidade muito a ajudaria com os desafios
que estavam por vir.
Desejo e saudade de Deus eram os sentimentos dos seus sete anos de vida.
Inicia nessa fase os primeiros sinais de uma vocação. A leitura do Evangelho,
especialmente o Sermão da Montanha, despertavam em Edenice uma necessidade de
servir a Deus.
Na adolescência, sentimentos típicos dessa fase permeavam seu ser. O
despertar de ser mulher, a beleza, estudo, trabalho, sonhos, namoro... eram
muitas interrogações e inquietações. Encontrava na família seu porto seguro. Na
mãe tinha uma inspiração: ser uma grande mulher como ela.
A decisão de seguir a vocação religiosa encontrou inicialmente
questionamentos na família, mas diante da resolutividade e determinação de
Edenice, tudo foi aceito e apoiado. Hoje, distante da família e amigos, encara
a saudade como uma forma de amar, e acrescenta: “Para seguir a vocação é
necessário deixar a família para formar outra família”.
Apreciadora dos estudos, da pesquisa e da leitura, se orgulha de ter
concluído todos os cursos que iniciou (isso não é para todos). Tem um currículo
invejável. Fez o ensino pedagógico, formou-se em Pedagogia, Teologia e Serviço
Social. Especializou-se em Arteterapia e Planejamento e Gestão Escolar. Edenice
não para. Sedenta por aprender, ávida em aplicar seus conhecimentos, sobretudo
entre os mais carentes, entre os jovens, entre os que precisam de qualquer
ajuda.
Sua experiência de 25 anos de magistério a qualifica para trabalhar com
projetos desafiantes. No Colégio Santa Cecília e noutras instituições,
trabalhou como assistente social, proferiu palestras, fez orientação
espiritual, formou lideranças. Também atuou como conselheira espiritual de
equipes jovens de Nossa Senhora, asseverando que trabalhar com os jovens é um
prazer e um aprendizado constante.
Força, verdade, justiça, trabalho e fé são valores em sua vida. E foram
esses ingredientes que a fizeram tomar a decisão de assumir uma missão
desafiadora de morar no Haiti no ano de 2017. E quando se pergunta quais os
motivos que a levaram a ir para um país tão pobre e cheio de dificuldades, ela
responde através do Evangelho: “Bem-aventurados os que tem fome e sede de
justiça, porque eles serão fartos” (Mt, 5:6); “Amai-vos uns aos outros, assim
como eu vos amei” (João 15:12); “...A fé sem obra é morta” (Tg, 2:26). De fato,
é preciso uma motivação incomum para lidar com a realidade haitiana. Irmã Edenice
contou que “99,99% das pessoas dormem no chão, há um mar de fome, de sede, falta
escola, há sofrimento para todos os lados. O que a fez continuar era a certeza
do Reino de Deus e o seu amor para com a humanidade”.
Deus é um capítulo à parte na vida da missionária. “Deus é o Senhor da
minha vida. Há uma relação esponsal, entretanto, é um amor concreto de uma
dimensão mística. Não há explicação, vivo algo muito profundo. É uma resposta
de amor a Deus.” A foto do perfil nas redes sociais da religiosa é a própria
imagem de Jesus Cristo.
Por fim, falamos de sonhos... Doutorado em Espiritualidade é a resposta. E
diante de tanta determinação, força e persistência, sabe-se que será uma
questão de tempo.
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