quinta-feira, 19 de setembro de 2019

Como realizar sonhos através da educação





Nascida no interior do Ceará, no Município de Morada Nova, Keivianne da Silva Lima Reges foi morar em Limoeiro do Norte ainda bebê. Teve uma infância tranquila até os sete anos, quando seu pai saiu de casa. Poderia ser mais uma das tantas crianças que não tiveram oportunidades e iriam engrossar as fileiras do desemprego, de uma vida estritamente doméstica, sem vislumbrar muitas perspectivas.
Mas para ela foi diferente. Por quê? Não se sabe ao certo, mas o que se tem certeza é que a educação foi o trunfo que Keivianne teve para conseguir um futuro diferente.
Para sustento da família, teve que ajudar a mãe, fazendo e vendendo salgados na vizinhança e bairros próximos da sua casa. Depois foi trabalhar como babá para ajudar à mãe, que ainda tinha uma filha pequena e não recebia pensão alimentícia do pai. O salário de Keivianne era a receita principal da casa.
O relacionamento com a mãe e as irmãs era de união, resguardando um amor por essa pequena família.
Casou-se aos 17 anos. Outra vez, a vida poderia ter tomado um rumo mais “normal” para as adolescentes que casam prematuramente. Poderia ter deixado de estudar, trabalhar e ter filhos nessa idade. Novamente aconteceu diferente para Keivianne. Ela continuou trabalhando e estudando, pois tinha o sonho de se formar. Eis aqui outro aspecto marcante da sua trajetória: ela tinha um sonho, que a afastou, mais uma vez, das estatísticas das meninas da sua idade que casavam. O casamento entre educação e sonho a direcionou para outros caminhos.
         Os filhos só vieram depois da formatura. Aos 28 e 30 anos, ela teve a experiência da maternidade, outro momento marcante em sua vida, mas que foi decidido com maturidade e no momento apropriado, para que ela pudesse realizar mais um sonho: o de ser mãe.
         A convicção do estudo veio de várias fontes inspiradoras: a mãe, que a incentivou, não permitindo que ela desistisse de estudar, mesmo estando cansada do trabalho. O esposo, que possuía um curso técnico, e falava muito sobre sua experiência no meio acadêmico, tendo sido o seu maior incentivador, financiando cursinhos e vestibulares, e a família para quem ela trabalhava, em que os patrões eram formados, situação que lhe chamou a atenção.
         A sua percepção de que os estudos mudavam a vida das pessoas foi decisiva para ela querer essa mudança. Ter um salário melhor, e consequentemente uma condição financeira mais elevada, foram fatores que a motivaram a persistir no mundo acadêmico.
         Mas a obstinação em alcançar seus sonhos também trouxe desafios. Como trabalhava na adolescência, não tinha muito tempo para se dedicar aos estudos, portanto, a base teórica foi prejudicada. Foram necessários vários cursinhos preparatórios e vestibulares até conseguir passar. O primeiro ano da graduação também foi muito difícil devido às mudanças e a distância da família. Após adaptar-se, conseguiu ter ritmo de estudos e a entrada no mestrado foi algo natural.
Quanto à universidade pública, ela se surpreendeu positivamente, pois desde que comprovou sua “baixa renda”, logo conseguiu moradia com água, luz e internet dentro da própria universidade, além de uma bolsa de incentivo na qual podia custear sua alimentação.
Já no mestrado, teve a oportunidade de ir para a Universidade Federal do Ceará mediante o recebimento de bolsa, com acesso ao restaurante universitário, onde fazia suas duas principais refeições a um custo muito baixo.
Sua especialidade é a área de produção de mudas de espécies frutíferas e o reuso de água na agricultura. Houve forte identificação com a agronomia pelas inúmeras possibilidades de atuação e pela região que reside ser um polo produtor.
Entre o mestrado e o doutorado, fez-se mãe, somando outras jornadas na sua trajetória. Atribui a sua determinação à muita fé e força de vontade, além da ajuda da família, e em especial do esposo. Elencando suas prioridades, ela afirma que quase sempre vem primeiro os filhos, e depois o doutorado, por ser o sustento da família. O marido se encontra desempregado e a bolsa do doutorado é o que mantido Keivianne na universidade, pois se não fosse isso, teria que parar de estudar.
Keivianne da Silva Lima Reges é engenheira agrônoma, formada na Universidade Federal Rural do semiárido UFERSA, campos Mossoró-RN, fez Mestrado na Universidade Federal do Ceará UFC-CE, e atualmente é Doutoranda na Universidade Federal Rural do semiárido-UFERSA, campos Mossoró-RN.
E ainda tem muitos sonhos a realizar, inclusive de inspirar seus filhos a realizar os seus.

domingo, 1 de setembro de 2019

Reportagem - Os desafios que os venezuelanos enfrentam no Brasil



       Diante da crise econômica, social e política que a Venezuela vem enfrentando, o Brasil tem recebido inúmeros cidadãos daquele país. Eles têm migrado para vários estados como Roraima, Pará, Amazonas, Ceará, dentre outros destinos. Em Fortaleza, não há estatísticas precisas, mas vários venezuelanos estão vivendo na cidade, enfrentando inúmeras dificuldades como regularização de documentação, moradia, emprego, educação para as crianças, acolhimento de forma geral.

       Muitos dos venezuelanos tem se dirigido ao Serviço Pastoral do Migrante, uma ação específica da Igreja Católica existente há 35 anos, que oferece um serviço de acolhida aos migrantes e refugiados, além de prestarem informações sobre documentação necessária para se regularizarem, indicação de postos de trabalho, além de ajuda humanitária, mas ainda é não é suficiente para atender às demandas de tantas pessoas que estão optando em morar em Fortaleza, sejam eles de outras cidades, estados ou países.
       A irmã Idalina Pellegrini, da Congregação Missionárias Scalabrinianas, explica que no Ceará não existem políticas públicas direcionadas para os migrantes, diferentemente de São Paulo que já consolidou iniciativas em favor dessa parcela da população. Ela, juntamente com outras irmãs, estão na Arquidiocese de Fortaleza desde 1995, a convite do Arcebispo Dom Aluísio Lorscheider, e junto a leigos voluntários, coordenam o serviço Pastoral dos Migrante. Relata que, entre os anos de 2010 a 2013, nosso Estado também recebeu muitos estudantes africanos, com a promessa de um custo de vida barato e que se defrontaram com uma realidade diferente da que foi anunciada para eles. 
       A missionária informa que “No ano de 2018, intensificou-se a chegada de venezuelanos. A Pastoral do Migrante acolheu mais de 45 pessoas que chegaram sem nenhuma referência, mães grávidas com crianças, necessitando de moradia, alimentos, escola e orientação. Na cidade muitos outros se estabeleceram com seus próprios recursos”, comenta.  Em alguns casos, recebem cestas básicas e bolsa família.  Alguns conseguiram emprego, outros não. Irmã Idalina ressalta ainda, que alguns venezuelanos tem diploma superior e elevada qualificação, mas diante da dificuldade de emprego, eles tem exercido funções como vendedor ambulante, pedreiro, auxiliar de pedreiro, motorista, cozinheiro, faxineiro, entre outros, para conseguirem efetivamente uma oportunidade de trabalho, muitas vezes temporário.
       Conversamos com José Pinheiro Castillo, natural de Caracas, engenheiro de informática, mora no Brasil desde 2016, residente em Fortaleza a partir de abril de 2018.  Ele conta da saga que é sair de Caracas, passar por Pacaraima em Roraima, dirigir-se a Manaus, onde a dificuldade de trabalho com carteira assinada é muito maior, e finalmente, chegar em Fortaleza. Hoje, esse percurso, está durando em torno de 12 dias. Na busca de uma vida melhor, esse venezuelano, assim como milhares de conterrâneos seus, abrem mão de casa, emprego, família, sonhos, para tentar uma nova vida no Brasil, pois a sua terra só traz incertezas e instabilidades. Precisa ter coragem para sair, mas também precisa ter coragem para ficar lá. De toda forma, aquele povo tem sido bravo. Advertiu que sua irmã e um sobrinho ficaram morando na casa deles e cuidando de uma fazenda, pois senão o “governo pode tomar conta dos seus bens”. Há os comunas, que são “olheiros” que espreitam se os imóveis estão abandonados para informar ao governo, e este, tomar posse.
       Castillo se intitula apolítico, é avesso a radicalismos e contrário à política econômica implantada pelo Presidente da Venezuela Nicolas Maduro. Para o governo do seu país, ele é considerado “traidor da pátria”, assim como todos que foram morar noutro lugar sem autorização.
       Ele já é residente permanente no Brasil, trabalha atualmente num pequeno mercadinho como empacotador, mas sonha em colocar um negócio próprio em sua área: assistência técnica em computadores, conserto de notebooks e impressoras.  Também atua como voluntário na Pastoral do Migrantes às terças e quintas, auxiliando outros venezuelanos, que como ele foi um dia, não sabem por onde começar. Do engenheiro de informática que atuava em Caracas ao empacotador do mercadinho em Fortaleza, José Castillho, mantém os sonhos e a esperança de uma vida melhor.
       Há jovens voluntários que se identificam com a causa dos migrantes. Sandra Cristina Pina Costa e Lucas Mateus Diniz Miranda participam do “Programa Magis”, um programa nacional voltado para a juventude no âmbito social e espiritual. Ambos são voluntários num espaço que acolhe migrantes venezuelanos e constatam que as maiores dificuldades enfrentadas por eles são um espaço para ficar, estudo para as crianças e emprego para os adultos. Afirmam que os que chegam até Fortaleza, vem de Belém ou Manaus, e querem trabalho para se sustentarem. Sandra Cristina e Lucas Mateus são naturais de outro estado brasileiro e conhecem bem o dilema de não estar em sua cidade natal, daí o carisma e a missão de acolher pessoas de outros lugares e nacionalidades.
       Uma família formada por sete pessoas, sendo quatro adultos e três crianças, moram no Bairro Pirambu e tentam realinhar suas vidas a partir da realidade fortalezense.
       Yitza Medina, vinda de Caracas, reside aqui com seu esposo, Gregory José Medina, seus três filhos que tem as idades de um mês, dois e nove anos, seu pai, Gerson Medina e seu cunhado, Angel Hernandes. Todos sem emprego formal, mas esperançosos e ansiosos por trabalharem e se capacitarem. Uma característica marcante dos venezuelanos é que eles se qualificam incessantemente. Yitza é administradora de empresas com especialização em comércio exterior, mas já fez cursos de confecção de bijuterias, bordados em sandálias, manicure, decoração de festas, além de falar espanhol (sua língua pátria), inglês e está matriculada num curso gratuito de português. Paga o transporte para se deslocar para o curso de português com as bijuterias ou outra arte que tenha feito na semana. Apesar de tanta qualificação, ela se dispõe a trabalhar em qualquer área, inclusive fazendo unhas, faxina e arrumação de casas. Não se sente inferior por aceitar qualquer tipo de trabalho. Parece que se habituou a grandes enfrentamentos e está sempre disposta a aprender mais. A maternidade não é um empecilho quando se pergunta como ela fará para trabalhar com três crianças em casa. Ela responde que junto com o esposo Gregory, se revezariam, sem falar que as crianças maiores já estão matriculadas numa creche perto de casa. Durante a entrevista, Yitza amamentou Valentina de um mês de idade, uma bebê brasileira, que complementa essa família de obstinados. Conclui que pretende revalidar seu diploma de graduação e especialização e não vê a hora de voltar a trabalhar.
       Angel Rafael Hernandez, é casado com a irmã de Yitza, Karen Yuliet Medina, aguarda sua esposa terminar o curso de Direito em Caracas para trazê-la ao Brasil e tem um currículo de policial invejável. Realizou curso de treinamento policial, de reação tática do veículo anti-emboscada, de proteção tática e controle de riscos SWAT, curso internacional sobre proteção executiva e supremacia em ação, curso de artes maciais mistas e tantos outros cursos técnicos. Como eu falei anteriormente acerca dos venezuelanos, Angel Rafael também tem versatilidade para realizar outras atividades, pois trabalhou como florista, plantou, colheu e vendeu flores. No Brasil, Angel atuou como ajudante de pedreiro em algumas obras, mas atualmente não está trabalhando. Ele, diferentemente de Yitza e Gregory, ainda não entende bem português, o que dificulta mais ainda sua empregabilidade. Quer atuar na área de segurança, mas não sabe por onde começar.
       O esposo de Yitza, Gregory José Medina, tem formação em gastronomia, conserta telefones celulares e trabalhou como supervisor de loja de telefonia. Gregory foi o pioneiro da família a sair da Venezuela, mudar seu destino, ir à Colômbia, passar um ano, mudar novamente e vir para o Brasil, escolhendo por último, Fortaleza para morar e trazer a família. Na Colômbia a experiência foi extenuante, trabalhava de 7h30min às 23h30min e ganhava o relativo a R$ 25,00 por dia. Definitivamente, não aguentaria. Ele pesquisou e achou que o Brasil fosse uma melhor opção. Mudou. Viajou. Foi a Manaus, foi a Belém, mas preferiu Fortaleza. Trouxe a esposa, os filhos, o sogro e o concunhado. Uma nova realidade o esperava, ou melhor, ele fez uma nova realidade surgir.
       Em Manaus, foi à Polícia Federal, e tirou “carta de refúgio”, uma identidade com validade de um ano, mas não se adaptaram na capital amazonense. Sentiram-se discriminados, provavelmente por já existirem muitos migrantes naquela cidade. Escolheram Fortaleza por ser uma cidade turística e ter mais oportunidades para pessoas com a sua formação inicial: cozinheiro profissional. Decidido o destino, vieram ele, a esposa e os dois filhos.
       Nesse momento, me coloquei no lugar deles, lembrei das viagens que fizera, quando chegava cansada do trajeto. Já tive de pegar ônibus, taxi, uber, ou ter algum familiar esperando, essa é a melhor das opções disparadamente.
       Quando Gregory e Yitza chegaram na rodoviária, não havia ninguém para recebê-los, não tinham para onde ir, onde ficar, não sabiam o que iam fazer, nem o que comer. Essa é a realidade de chegada dos refugiados. Uma completa indefinição do por vir, mas uma luta destemida pela sobrevivência. Seguiram com R$ 200,00 para viver em Fortaleza. Obtiveram algumas informações e foram para um abrigo de casais em situação de rua no Bairro Presidente Kennedy. Sentiram-se acolhidos. Tinham um lugar para dormir e refeições. Deram graças a Deus e são muito gratos a essa instituição. Passaram algum tempo nesse abrigo.
       Alguns meses se passaram e hoje conseguiram obter documentos como carteira de identidade e CTPS. Moram numa casa no Bairro Pirambu, recebem um benefício do bolsa família, ganham algumas doações de alimentos, e fazem alguns “bicos”. Yitza vende bijuterias e sandálias com pedrarias, Gregory vende cintos de segurança para crianças, mas alega dificuldade porque o brasileiro ainda tem preconceito com esse tipo de objeto, comparando a coleiras de cachorro, e o sogro e concunhado, conseguem trabalhos como pedreiro e ajudante, esporadicamente.
       A família tem vários sonhos: Gregory quer colocar um carrinho para vender comida venezuelana, Yitza quer trabalhar na área de comércio internacional, e Angel Rafael, que foi da Polícia Nacional da Venezuela, pretende trabalhar na área de segurança. O sogro pretende trabalhar como pedreiro e ter uma qualidade de vida melhor. Enquanto não conseguem exercer suas profissões, aceitam trabalhar em qualquer ramo, de ajudante de pedreiro (eles) à administração de empresas (ela).
       Segundo informações do Ministério da Justiça, constantes no site institucional, o fenômeno migratório teve início em 2017 e 2018. O registro de entrada na Brasil é de quase 331 mil venezuelanos. Cerca de 199 mil nacionais da Venezuela entraram via Pacaraima/Roraima, sendo que desse total, 101 mil já saíram do Brasil com destino à Colômbia ou Bolívia.
       Segundo dados de Janeiro de 2019 do Comitê dos Refugiados, 83.364 solicitações de reconhecimento da condição de refugiados foram registrados, além de 32.486 pedidos de autorização de residência, que configura outra alternativa migratória.
       Ainda de acordo com registros do Ministério da Justiça, foi instituída a Operação Acolhida, nas Cidades de Boa Vista e Pacaraima, que consistem em recepcionar, identificar, triar, imunizar, abrigar e interiorizar imigrantes venezuelanos em situação de vulnerabilidade. O processo de interiorização visa levar os imigrantes para outros estados e regiões do país com o objetivo de diminuir o impacto socioeconômico em Roraima.
       De acordo com dados da Organização Internacional para Migrações (OIM), o fluxo de interiorização dos venezuelanos é de 519 por mês. A recomendação para 2019 é que a média mensal atinja 1000 pessoas com o objetivo de desafogar os abrigos em Roraima e possibilitar a redução da população imigrante em situação de rua, estimada entre 1.200 a 1.500 pessoas.
       Dados do perfil sociodemográfico e laboral dos venezuelanos, fornecidos pelo Conselho Nacional de Imigração, mostra que 77% deles aceitam deslocar-se para outro estado brasileiro desde que encontrem condições mais favoráveis no destino, como oferta de trabalho e vaga em escola para os filhos, por exemplo.
       E o Ceará tem sido um dos destinos, entretanto, essa “acolhida” tem sido feita de maneira rudimentar, sem planejamento ou política instituída. Os venezuelanos são orientados a irem à Pastoral do Migrante, que os encaminha para outros órgãos (Polícia Federal, CRAS, etc.), a depender da necessidade de cada um.


Entrevista - Como realizar sonhos através da educação com Keivianne Lima

PERGUNTAS:

1.  Conte um pouco sobre sua história de vida.
Nasci na Cidade de Morada Nova e ainda bebê cheguei a Limoeiro do Norte, tive uma infância tranquila em família até os 7 anos, quando meu pai saiu de casa. A partir de então tive que ajudar minha mãe, trabalhei como babá para ajudar das despesas da casa, até me casar aos 17 anos. Depois de casada trabalhei, mas também pude estudar e então realizar um sonho de me formar.
Hoje sou engenheira agrônoma com especialização, mestrado e atualmente curso doutorado.

2.  Com qual idade você começou a estudar e a trabalhar?
Estudei desde os 4,5 anos e nunca parei de estudar...
Quando tinha 10 anos ajudava minha mãe, que aprendeu um oficio com sua vizinha (fazer salgados, coxinha em especial). Eu vendia esses salgados na vizinhança e nos bairros próximos. Aos 13 comecei a trabalhar como babá até os 17 anos.

3. Que tipo de trabalho você desempenhou? Por que começou a trabalhar tão cedo?
Trabalhei vendendo salgados, como babá, vendedora em loja.
Tive que começar cedo para ajudar minha mãe e irmã, pois não recebíamos pensão do meu pai e minha mãe não tinha profissão, além de ter crianças em casa, o que a impossibilitava de trabalhar fora.

4. Como era o relacionamento com a sua família?
Eu, minha mãe e minhas irmãs sempre fomos muito unidas, e com o restante da família conservamos um relacionamento discreto, sem muita convivência.

5. Quem era o responsável financeiro da sua casa? De que forma você contribuía?
Minha mãe fazia e vendia os salgados, que gerava uma renda muito baixa e depois que comecei a trabalhar de babá, a principal renda era a do meu salário.

6. Qual idade você casou e teve filhos? Fale um pouco dessa experiência.
Casei aos 17 anos e tive minha filha aos 28, e logo depois, aos 30, meu filho. Quando casei investi nos meus estudos e por isso resolvemos esperar terminar a graduação para então termos um filho. Como o mestrado veio muito rápido, inclusive antes de concluir a graduação, esperamos um pouco mais. O primeiro filho foi programado e veio no momento de uma pausa dos estudos. O segundo filho não foi planejado, com isso tive de esperar um pouco mais para seguir com os objetivos de seguir na pós-graduação.

7. Que incentivos você teve para estudar? Qual sua maior inspiração para os estudos?
A família para quem eu trabalhava de babá era toda formada, e isso me chamou muito a atenção. Minha mãe muito me incentivou, nunca permitiu que eu desistisse de estudar, mesmo estando cansada do trabalho. Meu namorado na época possuía um curso técnico e falava muito sobre sua experiência no meio acadêmico. Foi ele quem mais me incentivou a estudar, falava muito da importância de uma faculdade, financiava cursinhos e vestibulares.

8. Por que estudar foi uma prioridade na sua vida?
Porque eu via que as pessoas que tinham estudos mudavam suas vidas, e era essa mudança que eu queria para minha vida. Sabia que através de uma formação era possível possuir um melhor salário e uma melhor condição financeira para mim e minha família.

9. Onde você fez o ensino fundamental, médio, graduação, mestrado? E onde está cursando o Doutorado?
Ensino fundamental até a 7 série em escola pública: EEFM Arsênio Ferreira maia.
O último ano do ensino fundamental foi em uma escola particular por motivos de trabalho, financiado pelos empregadores.
Ensino médio na escola pública: EEFM Arsênio Ferreira maia.
Graduação: UFERSA- Universidade Federal Rural do semiárido, campos Mossoró-RN.
Mestrado: UFC- Universidade Federal do Ceará, Fortaleza-CE.
Doutoranda na UFERSA- Universidade Federal Rural do semiárido, campos Mossoró-RN.

10. Qual área você está se especializando? Em que momento você se identificou com a Agronomia?
Minha especialidade hoje é a área de produção de mudas de espécies frutíferas e o reuso de água na agricultura. Identifiquei-me com a agronomia pelas inúmeras possibilidades de atuação (muito abrangente) e pela região em que moramos ser um polo produtor, imaginei muitas possibilidades de trabalho.

11. Como foi o processo de deixar de ser babá e ser atualmente estudante de doutorado?
Foi um processo lento, pois como trabalhava na adolescência, não tinha muito tempo para estudar e a base para os estudos foi prejudicada. Foram necessários vários cursinhos preparatórios e vários vestibulares até conseguir passar. O primeiro ano da graduação também foi muito difícil devido às mudanças e à distância da família. Depois de adaptada e pegar o ritmo dos estudos, foi tranquila e natural a entrada no mestrado. Depois da maternidade ficou muito complicado, mas cheguei ao doutorado.

12. Conte um pouco da sua experiência em fazer a graduação, o mestrado, e atualmente o Doutorado, numa universidade pública. Quais as maiores dificuldades e as maiores vantagens?
Posso dizer que a universidade pública muito me surpreendeu, desde a graduação quando cheguei na UFERSA e comprovei minha “baixa renda” ou a minha necessidade, logo consegui moradia com água, luz e internet dentro da própria universidade, além de uma bolsa de incentivo, na qual eu custeava minha alimentação, ou seja, tive muito suporte oferecido pela universidade pública. No mestrado tive oportunidade de ir para UFC com bolsa, e mesmo sendo estudante de pós-graduação tive acesso ao restaurante universitário, onde fazia as duas principais refeições a um custo muito baixo. Atualmente tenho bolsa de doutorado e dela retiro todas as minhas despesas. A maior dificuldade era a distância da família.

13. Algum outro parente seu chegou a se formar? Quem?
Sim, uns 2 ou 3 primos com graduações feitas em universidades particulares. Apenas eu em universidade pública.

14. Como conciliar vida pessoal, casamento, filhos e Doutorado?
Com muita fé e força de vontade, com ajuda da família, em especial meu marido, que me ajuda em tudo. Quase sempre vem primeiro os filhos, depois o doutorado (por ser nosso sustento).

15. Diante dos cortes do Governo Federal na Educação, quais os impactos para você?
O meu curso de doutorado é de um programa que possui o conceito 6 (o único do Nordeste) e por isso não houve cortes nas bolsas como os demais programas de pós-graduação da UFERSA. Porém com os cortes e os contingenciamentos, a previsão é de que a universidade tenha verba para pagar seus fornecedores (água, energia e terceirizados) até o mês de agosto, com isso não haverá material nem laboratórios o que prejudica as análises previstas para a conclusão da minha tese. Com isso a UFERSA fecha as portas e o provável é que, subtraiam minha bolsa, e sem dados suficientes para publicação não concluo o doutorado. Dependo desse título para melhor me colocar nos concursos, pois dos 3 concursos já realizados para o cargo de professor substituto não consegui o êxito por não possuir o título, ficando em colocação inferior.

16. Qual a importância da bolsa do Doutorado atualmente? Sem ela, o que muda na sua vida?
Tudo muda. A bolsa de pós-graduação exige dedicação exclusiva, ou seja, não posso exercer nenhuma outra atividade remunerada. O único sustento da minha família hoje é essa bolsa, meu marido está desempregado há quase 3 anos. Sem bolsa e sem o título fica muito complicado....

17. Se você pudesse mandar um recado direto para o Ministro da Educação, qual seria?
Pare com as chantagens!!!! Tudo isso (dito pelo ministro em reuniões com reitores) para conseguir apoio para aprovação da reforma da previdência. A educação não pode parar....A universidade pública de qualidade já é um direito de todos! Vá fazer seu trabalho, invista na educação que é a única forma de transformar a vida das pessoas.

Entrevista - Cortes na Educação com Sarah Diva


PERGUNTAS:

1. Quais são suas atribuições na Universidade do Estado do Ceará?
Planejar e acompanhar as políticas de afastamento para pós-graduação. Atua na área de ensino na graduação e pós-graduação, além de coordenar projetos de pesquisa e extensão.

2. Como você avalia os cortes orçamentários na educação, autorizados pelo Governo Federal?
Os cortes, infelizmente,  ignoram o impacto social que a ação da Universidade provoca. Por exemplo, uma bolsa de 300,00 que é cortada representa a supressão do bem-estar do estudante carente (alimentação e deslocamento) e da sua família. Multiplique-se isso por milhares de estudantes sem essa bolsa e você terá aproximadamente milhares de famílias afetadas. O valor quantitativo e geral apresentado dos cortes não dá a ver os problemas em larga escala que serão gerados. Não se visualizam as pessoas atrás dos números, pois as cifras são impessoais. No entanto, na Educação as pessoas contam, elas não são uma conta

3. Quais os impactos desse contingenciamento no ensino e na pesquisa no ensino superior? E de forma mais específica, quais os impactos na Uece?
Os cortes chegaram  inicialmente nas verbas de custeio. O que significa isso? A cada ano, a verba diminui, mas permanece a necessidade da gastos gerais e mínimos. Isso gera uma aritmética improvável. Outro exemplo: quando houve a diminuição da verba de bolsa dos alunos, a UECE optou por diminuir o valor da bolsa de cada um para que todos pudessem permanecer recebendo. O que já não era muito, virou menos ainda. Mas essa foi a única forma de não excluir uma parte considerável de discentes dos benefícios da bolsa.

4. Como a Universidade do Ceará tem se posicionado com essas decisões de corte?
A Universidade publicou, em sua página, uma mensagem da Administração Superior posicionando-se contra os cortes e defendendo, ao contrário, o fortalecimento das políticas educacionais e de investimento.

5. Que tipos de alunos e programas serão atingidos por essa redução de custeio? De que forma?
As bolsas, em si, já são direcionadas para os alunos mais carentes e, além disso, a UECE é uma universidade que recebe muito aluno da rede pública, ou seja, já se caracteriza como entidade de função social. Tudo fica prejudicado, limpeza, manutenção de laboratórios, desenvolvimento de pesquisas etc. O pior, no entanto, é a desmotivação que isso gera, afinal são anos de estudo para um aluno ingressar na Universidade e se deparar com uma situação dessa natureza.

6. Algum projeto de pesquisa, programa ou serviço será descontinuado? Qual(is)?
Ainda não se sabe com certeza como se dará especificamente o desdobramento nos projetos, pois a ação do governo teve ampla e destacada reação negativa da sociedade. Mas os fundos de projetos como PEC, PET, PIBID e PIBIC podem sofrer grandes perdas.Ou seja, no planejamento estratégico da Universidade, não se poderá contar com a inclusão de novas pesquisas sem a certeza de financiamento.

7. Se ao invés de cortes, pudesse haver investimento, qual a maior demanda da educação de nível superior?
A demanda é na formação dos licenciados, futuros professores,  na inovação tecnológica e de saúde bem como nas ciências ambientais, setores essenciais ao desenvolvimento do país.

8. Se você pudesse mandar um recado direto para o Ministro da Educação, qual seria?
Vá estudar!

Artigo de Opinião - Comunicação Positiva - uma nova perspectiva de jornalismo



INTRODUÇÃO


            Hodiernamente o jornalismo tem sido um mecanismo de divulgação recorrente de notícias desastrosas, impactantes do ponto de vista negativo, por vezes grotescas, destinado a um público ávido por manchetes sensacionalistas, que expõem a desgraça humana, mostram o que o indivíduo tem de pior, gerando nos expectadores uma sensação de impotência, desânimo e desesperança, mesmo o público “fiel” desse braço do jornalismo, é influenciado negativamente por essas reportagens que enfocam, em demasia, fatos cruéis e torpes.
            Não se pode, obviamente, ocultar os fatos e deixar de dar a informação, afinal, isso é imprescindível na atividade do profissional do Jornalismo, mas o que se quer abordar com esse trabalho e até que ponto se informa ou deforma o acontecimento? Quais os objetivos reais de se massificar uma matéria que deixa claro a crueldade humana? E por que não, ao invés de se enveredar por esse tipo de abordagem, não se difunde exaustivamente notícias positivas, que demonstrem o melhor da raça humana?
Este é o objetivo desse trabalho, mostrar vertentes de um outro tipo de jornalismo, mais humanizado, priorizando notícias verdadeiramente reais, mas de impacto positivo no espectador, acreditando na máxima que preceitua “o que se foca, expande”.

  
O papel do jornalismo vai muito além de só informar, de contar como as coisas aconteceram, na verdade, tudo inicia muito antes, começa da escolha da pauta do que e principalmente de como será divulgado. No livro “O que é Jornalismo” de Cláudio Rossi, ressalta que “Há, portanto, um cone de sombra sobre toda uma área de atividade, diretamente ligada ao interesse da comunidade, que raramente ganha espaço na pauta, e por extensão, no próprio jornal, revista ou TV.”
É crucial que as notícias dentro de uma comunidade, sejam de cunho educacional, cultural, econômico, artístico ou social também venham a ser objeto de matérias, pois enfocam iniciativas sociais louváveis e que representam o que faz a diferença na vida daquelas pessoas, coisas bacanas de se ver e de se contar. Por que isso não é notícia? Claro que é!
Por outro lado, de que adianta dizermos e expormos todos os problemas da política, da corrupção, da operação lavajato, se não apontarmos soluções? Se não mostrarmos que antes sempre houve desvio de verba pública e agora, pela existência de uma sociedade muito mais exigente, tudo se tornou questionável.
Temos que mostrar que diante da globalização e do acesso à informação, os cidadãos passaram a ser mais participativos e opinarem mais. Se não fizermos uma notícia que dê perspectivas às pessoas, de que vale noticiar? Ver o circo pegar fogo?Já tem gente demais fazendo isso. Devemos sair da sombra, citada por Rossi, para exibir a informação politicamente correta e mais importante do que isso, apontando saídas e soluções, porque senão o jornalismo se torna um divulgador de misérias e um aniquilidor da esperança humana.
Acho que a hora é de escolher melhor as notícias que serão massificadas. Quantas pessoas estão engajadas no Brasil e no mundo inteiro tentando, e muitas vezes conseguindo, buscar soluções viáveis, sustentáveis. Vamos atrás dessas pessoas e dessas ações. Foquemos com lentes de aumento nos acontecimentos que nutram na sociedade a sensação de quem planta o bem colhe o bem, que o crime não compensa, de que nem tudo está perdido. Inúmeras ações de voluntariado estão por aí, a espera de serem vistas, de serem copiadas, de virarem manchetes, mas teimamos em achar que só notícias infelizes terão “ibope”.
Desafio a todos que forem escrever ou mesmo falar em algum canal de comunicação, desenvolver o raciocínio sobre a perspectiva de mostrar o que deu certo, qual lição, ou quem fez a coisa certa nessa situação, sem olvidar de narrar os fatos reais.
Neste sentido, cito o jornalista Ricardo Corrêa e editor-adjunto de política do Jornal Hoje em Dia de Belo Horizonte: “Fazer jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que seja publicado.” Não quero aqui contrapor a tese expressa na oração que tão bem define a chave de um jornalismo atuante e combativo. Nem defender a adoção de um jornalismo chapa branca, que seria ainda mais pernicioso do que o “jornalismo da depressão” que é vastamente praticado hoje no país. Mas é diferente propor um jornalismo que valorize as boas práticas na sociedade, aquelas que são capazes de transformá-la, indo além da pintura de um cenário de erro absoluto. Tenho realmente hoje a tendência a achar que e preciso alterar a lógica presente no jornalismo contemporâneo brasileiro, que é algo que me preocupa, sobretudo nas editorias de Política do jornalismo impresso, sob a pena de contribuir com a visão corrente de que tudo está caminhando só para pior, que não há mesmo saída e que estamos todos condenados a viver em uma sociedade injusta e cada vez mais distante das que queremos. Volto à frase que abre o texto para lembrar que se “fazer jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer se seja publicado”, também o é apresentar as boas práticas, os bons exemplos, que mudam a sociedade e que, certamente, os que defendem a inércia social não querem que sejam veiculados.” (Fonte: http://observatoriodaimprensa.com.br/feitos-desfeitas/_ed739_um_jornalismo_positivo_que_mude_a_sociedade/)
Comungo do pensamento do jornalista retro citado, sobretudo quando ele reforça a necessidade de apresentar as boas práticas e os bons exemplos, pois através desta comunicação, repassaremos a ideia de que a sociedade pode e deve seguir um caminho pró ativo e de resolutividade dos seus impasses e problemas e não apenas ser mero expectador das agruras dos acontecimentos.
Num contexto mundial em que a velocidade da comunicação é instantânea, maior é a responsabilidade dos tratadores da notícia, do que repassam, pois a consequência do que é informado é imediata. Por exemplo, na veiculação do fato do estupro coletivo, foi imensamente divulgado o ato em si, a quantidade de homens a participar do crime, a fragilidade da vítima. O que eu sugiro é que seja focada a atitude de mulheres que se mobilizaram para realizar a denúncia, que esta denúncia culminou com a instauração de inquérito e prisão dos envolvidos, que um movimento de mulheres prestou solidariedade à vítima, fazendo manifestações públicas, entre outras perspectivas, e ressalte-se, não deixando de informar o que aconteceu, mas sob uma ótica de mostrar o que se pode fazer para resolver a situação e o que houve de positivo a partir do fato lamentável.
Também neste sentido é a posição da portuguesa Catarina Rebelo de Sousa, jornalista de vários meios de comunicação social portugueses: 24 Horas, TV 7 Dias, TV Dois, TV TOP, Conheça Portugal - Turismo e Negócios e estudante da pós-graduação em jornalismo ISCTE/MediaCapital: “Ora, as nossas vidas já são tão duras e tristes que é urgente o jornalismo levar a alegria, o bem-estar às pessoas. Elas exigem-no. Precisam disso para não sufocar. Só assim as teremos como aliadas. Os nossos telejornais vão ao encontro da concorrência do que eles fizeram ou mostraram que nós não mostramos e, por isso, deixamos de fazer. Como consequência perdemos a audiência, o share, os números do dia. Não! Nada disto! O jornalismo está a perder a sua essência. Está a materializar-se em números que se traduzem em pessoas. E isto é errado. Quando pensamos no jornalismo pensamos em pessoas, nas suas vidas, nas suas histórias. Isso é Jornalismo. As pessoas e o mundo têm muitas histórias por e para contar. Coisas que nos fazem sentir felizes e realizados. As pessoas estão a pedir isto agora e mais que nunca. E nós dar-lhe-emos isso mesmo. Trabalhamos para as pessoas como seres humanos e indivíduos únicos. Não trabalhamos nem para máquinas nem para autómatos programados. Estamos onde as pessoas estão. Esqueçam os números. Foquem-se no essencial. O resto virá por acréscimo, acreditem.”
A lucidez e ao mesmo tempo otimismo da profissional impressionam, ela chama a atenção para o fato de que devemos esquecer os números e lembrarmos do essencial, das boas histórias, do que é genuinamente humano e não desumano.
Outra ponderação que se pode fazer é acerca de existir um acordo tácito na imprensa sobre não noticiar os suicídios ocorridos. Percebe-se que não se explora o tema, que é minimizado. Não é à toa que isso ocorre. Essa prática vem corroborar a tese de que ao publicarmos, sobretudo dependendo da forma de abordagem, há um contágio social, uma replicação do fato.
A jornalista Carolina Pompeu Grando, numa análise muito lúcida desse comportamento, aduz: “Existe uma convenção profissional extra-oficial, uma espécie de acordo entre cavalheiros, que determina: suicídios não serão noticiados pela grande imprensa. Ninguém sabe exatamente quando foi que este acordo foi selado, nem precisamente por que. O fato é que ele existe, mas aos poucos e discretamente tem sido descumprido: notícias sobre suicídios são publicadas, sim. Às vezes de modo sensacionalista, outras de modo superficial, e poucas de maneira aprofundada. Ainda assim, linhas editoriais e profissionais de imprensa sustentam que nas páginas de seus jornais não há espaço para suicídios. Por quê?
            Ao meu ver, essa omissão é justamente para não incentivar novos casos, mas também acho que essa não é solução, afinal o número de homicídios tem aumentado, além de ocultar situações reais que o público deveria saber. Reputo que a forma de se dar a notícia é que fará toda a diferença, sobretudo a sociedade poderia questionar por que os casos de suicídio tem aumentado. Especialistas poderiam dar suas opiniões e se traria à baila um assunto muito relevante e de ordem pública, pois se refere à saúde e sanidade humanos

O QUE PODERÍAMOS ENTÃO NOTICIAR?

Sugiro que fosse feito permanentemente, em todos os jornais, TVs e revistas, uma pauta dedicada a ações de voluntariado, para que além de dar visibilidade a estas ações, inspirasse outras pessoas a prestar algum serviço social. Poderiam ser citados casos práticos de pessoas que foram beneficiadas pelo auxílio prestado pelos voluntários e como suas vidas foram impactadas.
Por que não replicamos exaustivamente o caso dos pais que adotaram 6 crianças, filhos de uma amiga do casal que morreu de câncer? O caso do lixeiro que encontrou um grande valor em dinheiro e devolveu. Citar a freira que mantém uma casa para crianças com câncer e que mobiliza uma cidade inteira para ajudar. As ações de voluntariado que auxiliam crianças sem lar, moradores de rua, animais abandonados.
Outro tópico a ser abordado na comunicação positiva, são as ações sustentáveis realizadas por cidadãos individualmente, bem como por empresas, instituições e governos, sobretudo focados na preservação do meio-ambiente, divulgando soluções da melhor utilização dos recursos naturais.
Poderia ser falado também de como o esporte rotineiramente transformou e transforma a vida das pessoas, gerando oportunidades de mudanças. Por que não ousar e imaginar a possibilidade de ao final de cada matéria publicada, fosse feita uma abordagem de solução, dos efeitos positivos do que houve, de quais ações podem ser implementadas a partir daquele acontecimento, de abrir espaço para os espectadores, no caso do jornalismo de web, para sugerir boas práticas acerca daquele tema.
Comparo as notícias dados pela imprensa às notícias particulares que nos são passadas. Muitas vezes o que nos é dito de forma individual vai depender de quem diz, como diz e quando diz. É como quando assistimos aula com um professor excepcional, que nos motiva, que ilustra suas aulas, que dá exemplos práticos, vivências suas, que escuta as perguntas e valida as respostas, que tornam atraentes suas aulas pois tem amor pelo que faz, que envolve toda a sala com sua didática e postura. Imagine que outro professor dá a mesma cadeira, reforço, a mesma disciplina, mas com outra “vibe”, entra na sala desmotivado, taciturno, cambaleante no assunto, detesta ser interrompido, não gosta de responder perguntas e é sarcástico com as dúvidas dos alunos, a ponto destes se envergonharem de perguntarem e a aula se tornar um monólogo. Quem já não passou por esses dois professores?? Na verdade, eu estava escrevendo e lembrando deles...Acho que todos já experimentamos essas situações.
Com a notícia não é diferente, podemos fazer dela um verdadeiro pandemônio ou trazê-la para transformar realidades. Isso se falarmos das notícias pesadas, mas quando se tratam de notícias verdadeiramente inspiradoras, podemos fazer muito mais, podemos torná-las comuns, inseri-las no contexto social, massificar as ações do José e da Maria, que adotaram 6 crianças que perderam a mãe na grande notícia do ano.
Neste sentido, já existem iniciativas concretas, como por exemplo, o Movimento Independente pelas Notícias Inspiradoras, que tem uma página no Facebook, tendo como objetivo divulgar notícias positivas e que mostrem um pouco do BOM que se faz no País. Uma rede social que vai permitir ajudar os seus seguidores! Assim como o blog da jornalista que citei anteriormente, Catarina Rebelo de Sousa, intitulado “Jornalismo Positivo”. O que deixa claro que se trata de uma vertente que está se concretizando no mundo da comunicação.
O papel do jornalista tem que fazer sentido, e um sentido verdadeiramente social. No livro Comunicação – Dos Fundamentos à Internet, os autores Francisco Antonio Doria e Pedro Doria, dissertam que “Dizer é fazer visível o que ficava na sombra. Iluminar. Iluminar com a fala.” Num outro trecho, acrescentam: “Aqui surge, inteiro o problema da comunicação. Nasce no problema do sentido das coisas e do sentido das palavras. Mas nele não se isola e se limita. Vai além. Comunicação envolve quem fala e quem escuta. Diz do sentido, das coisas, dos textos urdidos em palavras, e do ambiente – contexto – no qual desejam alojar-se os sentidos produzidos. Onde nasce o sentido: onde está quem fala, escreve, desenha, pinta, faz imagem e palavra. Onde se firma o sentido: no contexto, na cultura.”
Os autores foram muito felizes quando usaram a expressão “iluminar”, pois essa função da palavra, do comentário, da comunicação é essencial para formarmos novos valores nessa sociedade tão massacrada por horrores, violência e apologia à desgraça humana.

CONCLUSÃO

O jornalismo tem papel preponderante no alavancar de mudanças sociais, políticas, econômicas e culturais. Noticiar fatos e acontecimentos através de uma comunicação resolutiva, positiva, no qual se apontam caminhos, tem sido uma solução viável para o contexto global. Não ser refém de uma cultura de massa, “escolhendo” matérias pré-definidas, não pode guiar a escolha das pautas de redação, há a necessidade de haver independência do profissional, liberdade para que ele, em contato com os fatos verdadeiramente relevantes para a sociedade, sejam levados à opinião pública.
Tratar a notícia sob um viés de sustentabilidade, gerando na sociedade a esperança de se encontrar soluções para todos os impasses, por mais difíceis que sejam, focar nas ações positivas, que ressaltam atitudes que conduziram a um bom desempenho individual, social, comunitário, institucional ou governamental.
Apropriar-se do sentimento de que temos sempre algo bom para informar ou tirar o bom do que foi ruim, sem em momento algum, esconder os acontecimentos, ocultar os fatos, que muitas vezes são sim estarrecedores, mas deixar claro que não são um fim em si mesmos, que a história não termina aí. Ao adotarmos o conceito da teoria quântica de “onde se foca, expande”, teremos uma perspectiva jornalística que viabiliza a vida em sociedade, prestigia as boas ações e auxilia na mudança de valores sociais. 

Um pouco da história de uma religiosa



Texto: Jamille Ipiranga

       Seu apelido era “Moça Branca”, nascida em Pernambuco, com sotaque lindamente carregado, filha de Manoel Lourenço e Maria Flauzina. Na linha de nascimento foi a sexta filha, sendo oito mulheres e quatro homens.
       Edenice Maria da Silva, nasceu no campo, em Gravatá no ano de 1964. Junto com seus pais trabalhou na agricultura, colheu café, algodão, mandioca e batata. Aos 12 anos brincava, mas também trabalhava, auxiliando os pais fazendo a manutenção de mercadorias dos pontos de negócios dos vizinhos. Integrante de família grande, do interior. Hoje são 12 filhos, 19 netos e 13 bisnetos.
       Esperta, ativa e cheia de sonhos, a criança Edenice pensava em ser professora ou empresária.
       Da infância, guarda muitas recordações felizes. Gostava de conversar com os pais e ouvir histórias. Pelo pai foi alfabetizada, pela mãe, catequizada. De família pobre, aprendeu cedo a lidar com poucos recursos, administrar o que tinha. Mais tarde veremos que essa realidade muito a ajudaria com os desafios que estavam por vir.
       Desejo e saudade de Deus eram os sentimentos dos seus sete anos de vida. Inicia nessa fase os primeiros sinais de uma vocação. A leitura do Evangelho, especialmente o Sermão da Montanha, despertavam em Edenice uma necessidade de servir a Deus.  
       Na adolescência, sentimentos típicos dessa fase permeavam seu ser. O despertar de ser mulher, a beleza, estudo, trabalho, sonhos, namoro... eram muitas interrogações e inquietações. Encontrava na família seu porto seguro. Na mãe tinha uma inspiração: ser uma grande mulher como ela.
       A decisão de seguir a vocação religiosa encontrou inicialmente questionamentos na família, mas diante da resolutividade e determinação de Edenice, tudo foi aceito e apoiado.        Hoje, distante da família e amigos, encara a saudade como uma forma de amar, e acrescenta: “Para seguir a vocação é necessário deixar a família para formar outra família”.
     Apreciadora dos estudos, da pesquisa e da leitura, se orgulha de ter concluído todos os cursos que iniciou (isso não é para todos). Tem um currículo invejável. Fez o ensino pedagógico, formou-se em Pedagogia, Teologia e Serviço Social. Especializou-se em Arteterapia e Planejamento e Gestão Escolar. Edenice não para. Sedenta por aprender, ávida em aplicar seus conhecimentos, sobretudo entre os mais carentes, entre os jovens, entre os que precisam de qualquer ajuda.
    Sua experiência de 25 anos de magistério a qualifica para trabalhar com projetos desafiantes. No Colégio Santa Cecília e noutras instituições, trabalhou como assistente social, proferiu palestras, fez orientação espiritual, formou lideranças. Também atuou como conselheira espiritual de equipes jovens de Nossa Senhora, asseverando que trabalhar com os jovens é um prazer e um aprendizado constante.
       Força, verdade, justiça, trabalho e fé são valores em sua vida. E foram esses ingredientes que a fizeram tomar a decisão de assumir uma missão desafiadora de morar no Haiti no ano de 2017. E quando se pergunta quais os motivos que a levaram a ir para um país tão pobre e cheio de dificuldades, ela responde através do Evangelho: “Bem-aventurados os que tem fome e sede de justiça, porque eles serão fartos” (Mt, 5:6); “Amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei” (João 15:12); “...A fé sem obra é morta” (Tg, 2:26). De fato, é preciso uma motivação incomum para lidar com a realidade haitiana. Irmã Edenice contou que “99,99% das pessoas dormem no chão, há um mar de fome, de sede, falta escola, há sofrimento para todos os lados. O que a fez continuar era a certeza do Reino de Deus e o seu amor para com a humanidade”.
       Deus é um capítulo à parte na vida da missionária. “Deus é o Senhor da minha vida. Há uma relação esponsal, entretanto, é um amor concreto de uma dimensão mística. Não há explicação, vivo algo muito profundo. É uma resposta de amor a Deus.” A foto do perfil nas redes sociais da religiosa é a própria imagem de Jesus Cristo.
       Por fim, falamos de sonhos... Doutorado em Espiritualidade é a resposta. E diante de tanta determinação, força e persistência, sabe-se que será uma questão de tempo.