quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Eu precisava falar sobre a pandemia

Texto: Jamille Ipiranga

 Ilustração: Marcilene Damasceno

 

Já estamos perto de finalizar o ano de 2021 e muitas coisas boas e ruins aconteceram nesses últimos dois anos. Em 2020 fomos “surpreendidos” por uma pandemia ocasionada por um vírus que já matou milhares de pessoas no mundo inteiro. Eu ainda não tinha escrito sobre isso, mas só agora com a situação da covid-19 mais controlada, me senti motivada a falar sobre o assunto.

Vivenciamos um período de horrores. Pessoas morrendo rapidamente infectadas pelo coronavírus. Hospitais lotados, pacientes sem oxigênio, caixões lacrados. Famílias enlutadas que não puderam fazer o velório dos entes queridos em virtude do risco da contaminação. Por meses, uma parte considerável da população ficou isolada em casa. Aprendemos, a duras penas, a trabalhar remotamente e a estudar virtualmente.

Deixamos de encontrar amigos e familiares presencialmente. Olhávamos para as ruas sem movimentação, mórbidas, cinzas, com vestígios de luto. Os dias isolados nos mergulhou em nossas dores e medos. Tudo parou, secou, entristeceu, morreu.

Precisamos, como nunca, buscar reforços no lúdico, nas artes, na música, na terapia e na fé. Foram fortalecedores num deserto que parecia não ter fim. Por vezes, pensamos ser o fim.  Começamos a valorizar as coisas simples, a família, o lar, os telefonemas para os amigos, voltamos a jogar com os filhos, amigos e companheiros. Videochamadas salvavam os almoços de domingo, os aniversários à distância.

Na cozinha, passamos a ser protagonistas de pratos improvisados, bem sucedidos nalgumas tentativas, noutras nem tanto. Então buscávamos outras receitas, outros ingredientes para viver, inclusive. As relações interpessoais nunca foram tão testadas, casamentos foram desfeitos. Alguns já não era sem tempo. Houve um redimensionamento dos diálogos, foi necessário reaprender a conversar, a conviver.

A pandemia foi impiedosa com a mediocridade. Nós precisávamos ter um propósito, um porquê essencial ou sucumbiríamos. A grandeza dos verdadeiros líderes foi decisiva, proativa e salvou vidas. A desumanidade dos maus representantes desmascarou os genocidas. As ações dos corações nobres e valentes coloriam e transformavam um cenário desolador. 

Esse momento disruptivo da humanidade também trouxe com veemência a solidariedade. Doações direcionadas para os mais vulneráveis, campanhas se intensificaram para levar comida para a mesa de quem não tinha o que comer ou mesmo quentinhas para quem não tinha mesa. Muitas mãos e corações se juntaram para ajudar. A oração construiu superação. Deus se fez presente e foi âncora a evitar nosso naufrágio.

Hoje, um ano e meio depois do anúncio da pandemia permanecemos usando máscara, álcool em gel e mantendo certo distanciamento social. Muitos já estão vacinados contra a covid-19 e a rotina parece voltar aos poucos. A dúvida é: o que aprendemos com a crise sanitária mundial? Se retornarmos para o nosso cotidiano no mesmo frenesi de viver sem saber para quê ou por quê, perdemos uma grandiosa oportunidade de ressignificarmos nossa existência.

Por outro lado, se a resposta for implementar a mudança de cuidar de si, dos outros e da natureza, o aprendizado foi valioso e fecundo. Como vamos lidar com nossa vida e a dos outros de agora em diante, alinhados ou não, com princípios universais como justiça, honestidade, bondade e integridade, ditará para qual lado o barco da nossa vida navegará ou se ficaremos à deriva de outras fatalidades ou pandemias